sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Uma reflexão ambiental

"A vida é tão preciosa para uma criatura muda quanto é para o homem. Assim como ele busca a felicidade e teme a dor, assim como ele quer viver e não morrer, todas as outras criaturas anseiam o mesmo." 
(Dalai Lama) 

por JÉSSICA LEME*

O ramo da História Ambiental é relativamente recente, surgiu após os movimentos ambientalistas do final dos anos 60 e 70. Através dela busca se discutir, questionar, saber a fundo questões relacionadas ao meio natural com ou sem interferência do homem. 

O homem, desde seu surgimento e gradativa evolução, usufruiu da natureza para se desenvolver física e psiquicamente. Como exemplo podemos citar senão a maior conquista, uma das maiores, da chamada Pré-História, a Revolução Agrícola (início do sedentarismo humano), que demonstrou que poderíamos ter algum poder em relação ao controle sobre a natureza. Nos dias atuais, diferentemente de algumas décadas passadas, a agricultura moderna não necessita mais delegar períodos de “descanso” para a terra ou depender de agentes naturais para combater pragas, assim como não dependemos mais da caça para conseguirmos carne, hoje facilmente encontrada em todos os supermercados de forma em que não identifiquemos o “animal” congelado ali. Ou seja, também detemos o domínio sobre várias espécies de animais. 

A modernidade, a ciência e também, talvez de forma mais violenta, o sistema capitalista levaram o homem a dominar, usufruir e destruir desenfreadamente os recursos naturais existentes no planeta. No início talvez aqueles homens não soubessem o que estavam fazendo quando, em períodos de colonização de novos territórios, destruíam várias formas naturais de vida em busca de lucros, porém, hoje e há muito, já sabemos quais seriam as consequências ambientais. O que no passado nos era dito como algo a ocorrer nos próximos 50 ou 100 anos chegou a nossa porta: mudança na climatologia terrestre; elevação das temperaturas; mudança no ciclo das chuvas, dos ventos, dos oceanos, etc. Existem diversas correntes de pesquisa olhando com atenção para todos os campos dessa questão delicada, ou seja, o que fizemos de nosso planeta. 

Toda essa explanação inicial se faz presente para que possamos de certa forma entender como nós enquanto seres humanos nos relacionamos com a natureza e o meio ambiente que nos cerca. Entende-se aqui meio ambiente por todo o espaço que nos envolve e não de forma errônea como algumas pessoas imaginam, como se o “meio ambiente” fosse ali aquele espaço verde longe de nossas vidas urbanas. 

A natureza em si vem sendo tratada de diversas formas pelo homem no decorrer da história. No período medieval era considerada divina, funcionava quase que como uma ministra de Deus que, quando zangado, nos punia usando de sua força selvagem. Com o surgimento da teoria evolucionista de Darwin, que sacudiu o mundo no século XIX, muito se pensou em relação a qual seria o papel da natureza em nossas vidas, já não era mais a punidora, era então uma agente de nossa evolução. 

Ainda no período em que chamamos de Idade Moderna (época das navegações marítimas e ascensão das monarquias europeias), inicia-se o processo de colonização das Américas, da África e da Índia. Consequentemente a exploração de recursos naturais em alta escala começa a acontecer. Para o homem da época essas ações nada fugiam daquilo que lhe era oferecido por Deus e confirmado nas escrituras. O mundo estaria aqui para nos servir: a natureza em toda sua plenitude era um instrumento de Deus para delegar o conforto dos homens. 

A degradação ambiental se intensifica alguns séculos seguintes quando já no final dos anos 1800 inicia-se a tão conhecida Revolução Industrial. Esta, porém, teve um papel mais que fundamental em como o homem contemporâneo trata a natureza. Nesse momento a urbanização aumenta e o homem passa a viver em sua grande maioria em centros urbanos cada dia mais “construídos” de forma a modificar a paisagem há tanto tempo comum e natural. Árvores, montanhas, lagos dão lugares a pontes, ruas calçadas, pequenos edifícios, grandes fábricas. O silêncio e o soar do canto dos pássaros se transformam em alertas de fábricas para o horário de trabalho. Carros tomam o lugar dos animais de carga e por aí vamos numa corrente sem fim em que estamos até hoje, o que chamamos de “evolução tecnológica”.

Inglaterra – Revolução Industrial. http://historia8alfandega.blogspot.com.br/
Nesse aspecto a “natureza” se torna algo antinatural. O homem já não precisa mais viver na floresta, e agir de forma selvagem. A natureza se torna um lugar inóspito, perigoso, onde somente os homens menos favorecidos permanecem vivendo (talvez daí venha estereótipos do tipo “homens do campo são mais ignorantes que sujeitos urbanos”). A partir daqui o homem se torna alheio ao meio natural, e quando nos sentimos “fora da natureza” fica mais fácil degradá-la sem nos sentirmos nos autoprejudicando. Ao mesmo tempo de forma contraditória usamos as montanhas, as praias, e paisagens inóspitas buscando a paz perdida na vida urbana em pequenos finais de semana ou férias, hoje a natureza significa um lugar para se descansar e “deixar” a rotina do dia a dia de lado, ou seja, mais uma vez nos referimos ao meio natural como algo separado do nosso cotidiano. 

Todos esses aspectos aliados à nossa falta de identificação com o natural, com o fazer parte efetivamente da natureza, talvez transpareça na nossa incapacidade de nos assumir enquanto homem predador, homem que polui e destrói o meio em que vive. Estamos acostumados a questionar governos, a exigir mudanças nas leis ambientais, na contenção de exploração ilegal de madeiras, água, na compra e venda de animais exóticos e selvagens, na contenção da caça e pesca predatória. Questões evidentemente importantes, é claro, porém longe de nossos lares, e em muitas vezes de nosso alcance. 

A questão do lixo, dos resíduos, da poluição é algo palpável ao nosso dia a dia, é comum a todos. Mais uma vez talvez o homem tenha a tendência a se autoboicotar quando criou os lixões para depositar tudo aquilo que foi produzido, usado e posteriormente rejeitado, como se em um passo de mágica tudo desaparecesse. Há muitos anos, desde o final dos anos 80, debates sobre estas questões tem se intensificado perpassando o problema do lixo, da poluição do ar e os reflexos que isso traz para a saúde humana, animal e principalmente do planeta. 

O Brasil, a partir de seu crescimento econômico e social dos últimos anos, passou a produzir mais dejetos. Mais pessoas estão consumindo e, consequentemente, produzindo lixo. E infelizmente essa nossa falta de consciência ambiental nos faz paralisados e pouco interessados quando o quesito é agir de forma consciente para com a natureza. Quando o lixo não vai embora pela manhã para algum lugar onde não me incomode ficamos perdidos sem saber o que fazer com nossos próprios dejetos. Dados do Instituto Akatu que desenvolve um trabalho na área ambiental nos mostram essa tendência a maior produção de lixo pelo brasileiro. 

“Em 2013 o Brasil produziu mais resíduos sólidos: foram 76,4 milhões de toneladas, o representa um aumento de 4,1% em relação a 2012, segundo levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). A geração de resíduos é um indicador muito representativo do nível de produção e consumo e, em muitos casos, também de desperdício. O resíduo do nosso consumo é apenas uma parte, e bem pequena, do total dos resíduos gerados durante o processo...” (Akatu e site www.akatu.org.br. Saiba mais em www.akatu.org.br/DireitosAutorais

Claramente a questão ambiental deve ser discutida nas escolas, nas entidades sociais, sindicatos, enfim, todos os locais em que se tenham grupos sociais organizados. Eximirmo-nos do compromisso e responsabilidade sócio-ambiental já não nos cabe mais. Cobrar das entidades públicas o trato responsável com o lixo é de extrema necessidade, porém questões palpáveis como a reciclagem do lixo “limpo” (plásticos, papéis, etc), o devido recolhimento de produtos eletrônicos, remédios, e outros rejeitos tóxicos devem ser ainda mais cobrados. Se a sociedade capitalista preza pelo lucro seja como for, que se entenda que essas ações para com o lixo são lucrativas, ganha-se dinheiro, ganha-se para o meio ambiente, ganha-se para o bem estar de todos os homens e animais. 

Demandas financeiras para a instauração de um sistema de coleta seletiva requerem investimento financeiro sim, porém a consciência humana sobre sua responsabilidade para com o lixo que produz é algo muito mais valioso a se conquistar. A velha história de se jogar lixo somente no lixo, de não poluir rios, córregos, entre outros locais verdes com resíduos residenciais, ainda é atualíssima visto que ainda é negligenciada por grande parte da população. 

Ações de acúmulo de lixo nas ruas por falta de coleta não podem ocorrer em uma sociedade educada ambientalmente. Lixo na rua causa mau cheiro, facilmente é levado por animais como gatos e cachorros, podem acarretar doenças como o surgimento de dengue, toxoplasmose, entre outras. Mesmo com uma coleta ineficiente é de nossa responsabilidade saber armazenar nossos próprios dejetos até que o caminhão faça sua recolha. 

Leia também: 

Como fica a situação dos prefeitos que não eliminaram os lixões:

Saiba mais em: 

AKATU 

CEMPRE 
http://www.cempre.org.br/index.php


* Jéssica Leme é licenciada em História e Mestranda em História, Cultura e Identidade na UEPG. Estuda discurso, representações: produção de sentidos. Pesquisa História e Fotografia, Getúlio Vargas e Estado Novo no Paraná. Atua como professora no ensino fundamental no Colégio Adventista de Itararé.

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