quinta-feira, 16 de outubro de 2014

"Nada deve parecer impossível de mudar"

por OSVALDO RODRIGUES JUNIOR


Na semana passada publiquei uma breve análise dos resultados das eleições de 2014 para o legislativo, indicando exemplos de deputados federais homofóbicos, racistas e favoráveis à Ditadura Civil-Militar que representarão Levy e o seu "aparelho excretor" no Congresso Nacional. Porém, se "Levy estará no Congresso", ele não estará sozinho. Se, de um lado, assistimos à ampla vitória do conservadorismo de extrema-direita, de outro, assistimos a um resultado bastante expressivo do Partido Socialismo e Liberdade - PSOL - nas eleições legislativas estaduais e federais.

Desde a sua fundação, em 2005, organizada por Babá, Heloísa Helena, Luciana Genro e João Fontes, que votaram contra a Reforma da Previdência e foram expulsos do PT, o PSOL nunca esteve tão representado no Congresso Nacional e mesmo nas Assembleias Estaduais. Porém, esse resultado não pode ser explicado apenas pelos números obtidos no último dia 5 de outubro. 

Em 2006, primeira eleição do PSOL, Heloísa Helena foi escolhida pelo partido como candidata à Presidência da República. Com um resultado expressivo, a candidata obteve a terceira colocação, feito um tanto quanto inesperado para uma campanha modesta e combativa. Uma das explicações para o fato, foram os votos dos "petistas insatisfeitos" com as denúncia envolvendo o caso do "mensalão". Desta forma, Helena obteve 6% dos votos, o equivalente a 6.575.393 (seis milhões, quinhentos e setenta e cinco mil, trezentos e noventa e três) votos. 


Em 2010, a tendência era de que Heloísa Helena, até pelo resultado expressivo na eleição anterior, novamente disputasse o executivo nacional pelo PSOL. Porém, em decisão partidária, foi escolhido o nome de Plínio de Arruda Sampaio, candidato ao governo de São Paulo pelo PT em 1989. Tal fato desagradou Heloisa Helena, que acabou se distanciando do partido, criando um mal estar que reverbera até os dias de hoje. Plínio, no entanto, apesar de uma figura extremamente carismática e com um histórico impecável de lutas sociais, não obteve boa votação e ficou na 4º colocação com menos de 1% dos votos válidos, o equivalente a 886.816 (oitocentos e oitenta e seis mil e oitocentos e dezesseis) votos.


Em 2014, nova convenção partidária e Randolfe Rodrigues, senador pelo estado do Amapá, foi escolhido para representar o partido nas eleições presidenciais. Junto a ele, começaram a ser escolhidos nas convenções estaduais os candidatos ao governo. Em São Paulo, o professor de Filosofia da Universidade de São Paulo - USP - e colunista da Folha de São Paulo, Vladimir Safatle, foi o escolhido. Com a alegação de falta de apoio e pouca "ambição" do partido, Safatle abriu mão do pleito e causou um novo "mal estar" no partido. Para o seu lugar foi escolhido o professor de História da Universidade Federal do ABC - UFABC -, Gilberto Maringoni. No entanto, a maior surpresa aconteceu no dia 13 de junho do corrente ano. Alegando uma "crise na esquerda" e no próprio PSOL, Randolfe Rodrigues abriu mão da disputa da presidência e afirmou que o partido precisava de um nome de consenso, indicando Marcelo Freixo, então deputado estadual pelo Rio de Janeiro. Freixo sequer cogitou a possibilidade, e nova convenção foi convocada. Nesta convenção, realizada no dia 22 de junho de 2014, Luciana Genro, deputada estadual e federal pelo PT do Rio Grande do Sul, foi escolhida, por unanimidade, candidata à Presidência da República. 


Acompanhada de Jorge Paz, Luciana Genro se propôs a fazer uma campanha "coerente com os princípios do partido", como ela se acostumou a dizer, o que significa: não recebimento de financiamento privado; participação intensa da militância; combatividade contra os interesses dos "poderosos" ou, tecnicamente, do capital financeiro. Dentro desta propostas, a candidata participou dos debates televisivos e ganhou destaque com a sua postura incisiva contra Aécio, Marina e Dilma, nomeados pela candidata como "irmãos siameses". Em um dos momentos mais brilhantes da campanha, a candidata enquadrou Aécio Neves no debate da TV Aparecida sobre o caso da construção de um aeroporto com recursos públicos na propriedade de um tio de Aécio, na cidade de Cláudio, em Minas Gerais. Chamada de "linha-auxiliar do PT" por Aécio, Luciana respondeu dizendo que o mesmo "é tão fanático por privatizações que construiu um aeroporto com dinheiro público e deu a chave para o tio cuidar". No último debate antes do primeiro turno, na Rede Globo, Luciana voltou a questionar o candidato tucano, que de maneira intempestiva levou o dedo em riste para a candidata, que respondeu à altura. Aécio tergiversou e não respondeu a denúncia de corrupção noticiada pela Folha de São Paulo. 

Luciana atingiu 1,55 % dos votos válidos, ou 1.612.186 (um milhão, seiscentos e doze mil, cento e oitenta e seis) votos, obtendo o 4º lugar folgado na disputa, mesmo as pesquisas indicando o candidato do Partido Social Cristão - PSC, Pastor Everaldo, com 3% das intenções de voto. Parece pouco, mas se pensarmos que Luciana obteve mais votos que Everaldo e Levy Fidélix juntos, podemos considerar uma vitória das pautas progressistas contra o "fanatismo" religioso que inunda a política nacional. Não obstante, não foi a expressiva votação de Luciana a maior vitória do PSOL. 

O partido, elegeu nada menos do que 12 deputados estaduais e 6 deputados federais, o que significou um aumento de 100% na sua bancada estadual e federal. Na esfera estadual, Carlos Giannazi, incansável representante da educação pública, foi reeleito em 12º lugar com 50.789 (cinquenta mil, setecentos e oitenta e nove) votos, o que significou ainda a obtenção de uma segunda vaga na ALESP que será ocupada por Raul Marcelo, que teve 50.550 (cinquenta mil, quinhentos e cinquenta) votos. 

No Rio de Janeiro, palanque mais do que especial para o PSOL, Tarcísio Motta obteve, na disputa pelo governo, um resultado espetacular com 8,92% dos votos, ou melhor 712.734 (setecentos e doze mil, setecentos e trinta e quatro votos), Marcelo Freixo, principal nome do partido, foi reeleito como deputado estadual mais votado do Estado com 350.408 (trezentos e cinquenta mil, quatrocentos e oito) votos. Se não bastasse o resultado expressivo, Freixo "carregou" mais 4 candidatos com ele, todos farão parte da ALERJ no mandato 2016-2020. Outro ponto a ser destacado, foi a vitória do candidato nas comunidades mais carentes da capital, muitas delas controladas pelas milícias que o deputado combate desde fevereiro de 2007. Além disso, Freixo foi o mais votado em 18 municípios do Estado. 

No Congresso, farão frente aos deputados da bancada "religiosa", "da bala" e mesmo aos representantes de Levy, Ivan Valente, representando o Estado de São Paulo, Chico Alencar, eleito por quatro anos consecutivos o melhor parlamentar do país (pelos jornalistas do Congresso em Foco), Jean Willys, ativista do movimento LGBTT e também eleito o melhor parlamentar do país em 2012 e Cabo Daciolo, os três pelo Rio de Janeiro, e Edmilson Rodrigues representando o Pará. Desta forma, o PSOL se reafirma enquanto uma opção de esquerda, que tem como grande mote, a defesa das pautas progressistas. 


Diante disso, durmamos tranquilos, pois, se Levy estará no Congresso, Luciana também vai estar. 

Abraços, 
Osvaldo. 


* Frase do teólogo e poeta alemão Bertolt Brecht no poema "Nada é impossível de mudar": http://www.culturabrasil.org/brechtantologia.htm 

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