quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Quem tem moral?

por LETÍCIA SANTOS


Nas últimas semanas, declarações de políticos surpreenderam e causaram asco em parte da população brasileira e em parte do eleitorado itarareense.

Após se tornar público que oito vereadores de Itararé votaram contra um Projeto de Lei encaminhado pelo executivo municipal para incorporação de 348 mil reais para a Saúde e 17 mil reais para a Agricultura, como foi noticiado pelo Desafinado, o vereador Willer tentou justificar sua atitude e a de seus companheiros, afirmando que “tiveram que votar assim”, que a Prefeita teria dito que não precisava de vereadores e, por conta disto, tiveram que fazer sua vontade prevalecer, votando 'não'!

Ou seja, deixou claro que suas desavenças particulares são mais importantes do que seu trabalho político nesta cidade, de beneficiar e ajudar a melhorar a qualidade de vida dos moradores.

Outra declaração que causou repulsa foi a de Eduardo Cunha, Presidente de Câmara de Deputados, que afirmou “Aborto e regulação da mídia só serão votados passando por cima do meu cadáver”.


O que assusta é o posicionamento individualista desses políticos, representantes do povo, mas somente das pessoas que pensam como eles, deixando suas convicções e problemas particulares dominarem seu trabalho. Sandro Chaves, em seu texto “A ameaça do conservadorismo”, explanou muito bem sobre ideologias que costumam ter como base um certo moralismo, falando sobre políticos como Marco Feliciano, Jair Bolsonaro e, inclusive, Eduardo Cunha.

Ignorando os direitos das chamadas minorias, deixando de lado necessidades de toda uma cidade, para fazer prevalecer suas vontades e convicções pessoais, qual seria a justificativa? A moral já foi muito usada para explicar atitudes tirânicas como essas, em nome da “moral e dos bons costumes”, muitas pessoas já tiveram seus direitos reprimidos. Mas o que é moral? A moral de quem deve prevalecer?

O filósofo Friedrich Nietzsche fala sobre a moral como algo que nos é vendido pelos detentores do poder, que jogam seu senso comum no ventilador, e as pessoas reproduzem suas ideias, sem saber que na verdade pensam assim porque alguém quer que pensem assim.

Hans Kelsen, em sua obra Teoria Pura do Direito, fala que do ponto de vista científico, se rejeita o suposto de valores absolutos em geral e de um valor moral absoluto em particular, não há uma moral absoluta, isto é, que seja a única válida, que em diversas épocas, nos diferentes povos, classes e profissões, valem sistemas morais muito diferentes e contraditórios entre si, então afirmação de que as normas sociais devem ter um conteúdo moral, devem ser justas, para poderem ser consideradas como Direito, apenas pode significar que estas normas devem conter algo que seja comum a todos os sistemas de moral, enquanto sistemas de justiça. Contudo, também coloca em sua reflexão a dificuldade em determinar qualquer elemento comum aos conteúdos das diferentes ordens morais, devido à grande diversidade daquilo que os homens efetivamente consideram como bom e mau, justo e injusto, em diferentes épocas e lugares.

Kelsen também fala sobre uma Teoria de valores relativista, que significa que não há valores absolutos, mas apenas valores relativos, que os valores que nós constituímos através dos nossos atos produtores de normas, e pomos na base de nossos juízos de valor, não podem apresentar-se com a pretensão de excluir a possibilidade de valores opostos.

Ou seja, na política o todo existe necessariamente antes da parte. 

Exemplo disto é o presidente do Uruguai, Pepe Mujica. Homem, heterossexual, afirma que nunca fumou maconha na vida, no entanto em seu governo promulgou a legalização do aborto, aprovou o matrimônio igualitário e regulamentou o uso da maconha.

Com isso, quero dizer que pouco importa se um juiz ou um governo gostam ou desgostam de algo. Como sustenta um dos maiores juristas do mundo, Ronald Dwonkin, o direito deve ser aplicado por princípios, e não por política ou por moralismo. O que esses guardiões da própria moralidade devem aprender é que nem tudo é sobre eles. E em nome da moral não é possível superar a Constituição, mesmo que isso me desagrade ou desagrade a outras pessoas.

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