quarta-feira, 17 de junho de 2015

Mas afinal, o que significa ser de esquerda ou direita?

por SANDRO CHAVES ROSSI

É muito comum ouvir os termos "direita" e "esquerda" nos dias de hoje, ainda mais depois das eleições de 2014, quando os ânimos foram bastante exaltados e que acabou dando um certo respaldo no processo de politização de muitos brasileiros. Quem tem o costume de usar a internet para acessar as redes sociais e acompanhar os sites de notícias, certamente já viu alguma discussão ou acusação envolvendo esses termos - inclusive nos comentários aqui do blog.

Muitos que leram ou ouviram esses termos não devem saber do que realmente se trata, pois quase sempre não há uma clareza no que a esquerda e a direita política defendem nessa "Guerra Fria" da internet, que quase sempre é protagonizada pelos mais diversos extremistas ideológicos que carregam muita desonestidade intelectual em seus discursos. Então do que se trata essa dicotomia política? 

Os termos "direita" e "esquerda" surgiram na França, durante as assembleias francesas do século 18. Era a primeira fase da Revolução Francesa (1789 - 1799), a burguesia tentava a todo custo diminuir o poder do clero e da nobreza, e pra isso buscava o apoio da população mais pobre. Quando a Assembleia Nacional Constituinte foi montada para criar a nova Constituição, a burguesia não gostou da participação das camadas mais populares e preferiu sentar separadamente deles, ficando no lado direito da Assembleia, enquanto os mais pobres ficaram do lado esquerdo, dando assim origem aos termos. Por isso, o lado esquerdo foi associado à luta pelos direitos dos trabalhadores, e o direito ao conservadorismo e à elite. 

Dentro desses parâmetros, ser de esquerda foi associado a lutar pelos direitos dos trabalhadores e da população mais pobre, a promoção do bem estar coletivo e da participação popular dos movimentos sociais e minorias. Já a direita representaria uma visão mais conservadora, ligada a um comportamento tradicional, que busca manter o poder da elite e promover o bem estar individual. Obviamente com o tempo tais ideias acabaram sofrendo reformulações e resultando em diversas correntes diferentes, porém a essência ainda é a mesma.

As definições de esquerda e direita eram bem definidas até a queda do Muro de Berlim (1989), que encerrou a polarização EUA x URSS, desde então as ideologias foram mais abrangentes e ambos os lados dessa dicotomia política configuraram boa parte do sistema político de vários países, talvez por isso seja tão difícil ver clareza nessas ideologias hoje em dia, porém elas ainda existem e são bastante pertinentes.

Uma das melhores definições sobre direita e esquerda é a do filósofo político Norberto Bobbio. Basicamente, Bobbio diz que a esquerda busca promover justiça social, enquanto a direita visa a liberdade individual.



"Esquerda e direita indicam programas contrapostos com relação a diversos problemas cuja solução pertence habitualmente à ação política, contrastes não só de ideias, mas também de interesses e de valorações a respeito da direção a ser seguida pela sociedade, contrastes que existem em toda a sociedade e que não vejo como possam simplesmente desaparecer. Pode-se naturalmente replicar que os contrastes existem, mas não são mais do tempo em que nasceu a distinção"
(Norberto Bobbio - "Direita e Esquerda - Razões e Significados de uma Distinção Política")

A esquerda tem como principal influência o filósofo alemão Karl Marx, enquanto a direita tem o economista inglês Adam Smith.



Marx é autor da obra "O Capital", em que ele faz uma análise minuciosa sobre o sistema capitalista e aponta seus defeitos e as consequências que eles trazem. Marx propõe a troca do sistema capitalista por um sistema socialista, em que o trabalhador realmente é valorizado (para Marx, quem realmente produz é o trabalhador e não o patrão, que é quem fica com a maior parte do lucro) e na construção de um Estado Social que visa acabar com a desigualdade social, que é inerente ao capitalismo.

Adam Smith é autor de "A Riqueza das Nações", obra em que ele propõe que o Estado não deve interferir na economia e que os mercados, na busca pela demanda, acabam promovendo bens de consumo a toda população. Smith introduz a teoria do "Livre Mercado", em que ele diz que através da lei de oferta e demanda, todos podem consumir produtos de alta qualidade por preços baixos, visto que o mercado sempre se adapta as necessidades dos consumidores, fenômeno que ele chama de a "mão invisível do mercado".

Na economia, a esquerda prega uma economia mais justa e solidária, com maior distribuição de renda. A direita está associada ao liberalismo e a neoliberalismo, doutrinas que na economia podem indicar os que procuram manter a livre iniciativa de mercado e os direitos à propriedade privada. Algumas correntes radicais defendem a total não intervenção do governo na economia, a redução de impostos sobre empresas e a extinção da regulamentação governamental. Para a esquerda, o liberalismo e neoliberalismo teriam como consequências a privatização de bens comuns e espaços públicos, a flexibilização de direitos conquistados pelos trabalhadores e a desregulação em nome do livre mercado, o que poderia gerar mais desigualdades sociais.

O liberalismo não significa necessariamente liberalismo social, por muitas vezes os adeptos do liberalismo econômico possuem um conservadorismo moral, visto que o adjetivo liberal é associado à pessoa que tem ideias e uma atitude aberta ou tolerante, que pode incluir a defesa de liberdades civis e direitos humanos. Nesse contexto, a esquerda é mais liberal que a direita, pois a esquerda busca a garantia dos direitos civis, como a descriminalização do aborto, a regulamentação do casamento gay e a legalização das drogas, atitudes que são contrárias as ideias de grande parte da direita, que por muitas vezes alegam defesa da moral, dos bons costumes e da família tradicional. 

Vale lembrar que é um grande equívoco achar que toda a direita tem o mesmo valor moral. Hoje em dia é muito comum partidos de direita adotarem a bandeira dos direitos civis e também é possível achar o oposto, partidos de esquerda com posturas mais conservadoras.

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