segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Que fase

A greve de servidores municipais e as lideranças políticas do presente em Itararé

por MURILO CLETO

Foto: Romeu Neto / TV Tem


Poucos eventos demonstram o grau de desgraçamento político em que Itararé se encontra do que os condicionantes da greve de funcionários municipais que se desenrola desde a última quinta-feira. Não sou absolutamente ninguém pra dizer de que lado eles devem ficar, mas também não poderia deixar de comentar o que sei a respeito do que está acontecendo.

Primeiro, a questão do mérito. O reajuste salarial oferecido pela prefeitura deveria ser de 10,67%. O número não é aleatório. É o que se precisa pra manter pelo menos igual o salário do ano passado. Na prática, um reajuste de 2% significa arrocho. E as consequências dele seriam trágicas não apenas pras famílias que dependem destes vencimentos, mas pra economia local. São quase 2 mil funcionários. É só fazer as contas do impacto negativo. 

Apesar de comum para os professores da rede estadual, como destacado pela prefeita, a proposta de parcelamento anual do reajuste é risível porque joga nas costas do próximo mandato um problema que não foi ele quem criou – algo com que a atual gestão sofre até hoje e serviu de explicação plausível para os principais problemas de caixa vividos pelo executivo. Além do mais, a economia não dá quaisquer sinais claros de que a inflação vá diminuir significativamente. E isso deve virar uma bola de neve.

Também pesa contra Cristina uma série de promessas não cumpridas quanto à redução de gastos com gratificações e horas extras. Ao contrário do anunciado, as gratificações não incorporadas permanecem intocadas. E não é segredo pra ninguém que, enquanto alguns comissionados carregam diversos setores nas costas, outros seguem onerando os cofres públicos sem nenhum retorno sob a forma de serviços bem prestados à população. Some-se a isso uma porção de contratações sem projeção de impacto na folha. É bem verdade que o gasto da gestão Cristina com cargos de confiança nem se compara ao de gestões anteriores, mas, quando sequer o mínimo é garantido, deveria estar na hora de rever até que ponto vale somente esta analogia pra justificar a letargia. 

Isso sem contar a eterna inabilidade de comunicação do executivo com população e trabalhadores, que serve não apenas pra que muita coisa permaneça não esclarecida, mas pra que muita coisa não se resolva. Depois da reunião com o sindicato, a prefeitura lançou uma “nota de esclarecimento” tenebrosa no site oficial, toda mal escrita – a ponto de ser incompreensível – e que não cita, uma vez sequer, a palavra “greve”. Pra falar a verdade, é graças à cobertura da TV Tem que se pode saber o mínimo acerca das posições antagônicas neste impasse.

Se por um lado é verdade que há muitos professores que não aderiram à greve na rede estadual e agora cruzaram os braços, é verdade, por outro, que muitos dos que apoiaram quando foi contra Alckmin agora se opõem quando é contra Cristina. As condições, evidentemente, não são as mesmas. Mas a base das reivindicações continua sendo a mesma, que é o reajuste. 

Inclusive lamento muito por aqueles que jogam com o argumento de que a greve atrapalha a população, na medida em que os serviços são interrompidos. Greve é pra atrapalhar, sim. Como que não? Se não atrapalhar, não exerce efeito nenhum de pressão. Se houver excessos, cabe à justiça decidir. Quem é ligado ao Partido dos Trabalhadores, cuja origem remonta às bases sindicais, deveria saber muito bem disso. 

Mas essa história tem um detalhe importante demais pra ficar de fora. Hoje quem convoca, articula e lidera a greve é, evidentemente, o sindicato dos servidores municipais, presidido por Willer Costa Mendes, vereador há 7 anos. Aquele mesmo que mentiu quanto à inconstitucionalidade do reajuste no ano passado, que disse que a prefeita “cacareja” no programa de rádio e que, até agora, na posição de legislador, não apresentou uma solução sequer pros graves problemas de arrecadação que o município vive faz muito tempo. Uma postura que não diverge muito dos demais. Porque tem uma questão matemática aqui: Itararé arrecada cada vez menos e precisa gastar cada vez mais. E quem resolve isso, junto ao Paço, é a Câmara.

Rigorosamente todas as alternativas propostas pelo executivo neste sentido foram destroçadas pela oposição. Chegaram a “confundir” ITBI com IPTU, quem lembra? Fraca demais na Câmara, a prefeitura abandonou todos os projetos que poderiam corrigir os privilégios fiscais ultrajantes que beneficiam os mais ricos. Além do mais, um pouco de atenção quanto à realidade nacional não faria mal a ninguém. Há municípios e estados que estão parcelando não apenas reajustes, mas salários integralmente.

Essa fragilidade pode ser percebida, por exemplo, pela crônica do absurdo protagonizada pelo legislativo na última quarta-feira, quando aprovou por conta própria o reajuste de 10,67%. A medida é ilegal e demagógica, afinal não são os vereadores que propõem o reajuste. Será que é demais, pra mim, como cidadão, esperar que a Câmara faça o seu trabalho e lute pra resolver o problema de arrecadação que vive o município, como demandam suas atribuições, em vez de fazer essas barbeiragens pra subir no conceito da população em ano eleitoral? Aí eles estão lá, todos pomposos com microfone na mão. Produtividade, 0. Falação, 10.

Neste momento, seria fundamental uma autocrítica de executivo, legislativo e sindicato quanto ao plano de carreira, que ninguém – e eu vou repetir pra ficar bem claro: ninguém – se coçou pra fazer, por razões muito claras: produzir plano de carreira é coisa pro futuro e que mexe com privilégios imediatos. Já pensou acabar com as gratificações, hoje o maior recurso de costura de alianças no interior da administração? Ninguém quer isso. Demanda tempo, planejamento e traz custos altíssimos de capital político.

Nenhum destes apontamentos, evidentemente, tem o objetivo de desqualificar a greve. Muito pelo contrário. A greve é legítima e vai continuar sendo até que a justiça diga o contrário – o que não deve acontecer. O que eu quero mostrar aqui é que o buraco é muito mais embaixo e que as soluções imediatistas interessam muito mais às velhas e desgastadas lideranças do que ao município. Aliás, não é chamando a prefeita de “megera” e quem discorda da greve de “louca”, mandando “trabalhar pra parar de encher o saco”, que os interesses da categoria serão garantidos. Neste momento, a greve serve de palanque pro que tem de pior na política local. 

Lamentavelmente, o que mais vai aparecer por aqui este ano são os mágicos da ação, que dizem exatamente o que fazer, mas esquecem, por acaso, de dizer como. Eu costumo chamá-los de políticos da somatória – aqueles que só mandam aumentar os gastos da máquina pública, sem dizer de onde tirar. Em 2012 foi assim e em 2016 vai ser pior.

Mas que outra opção têm os funcionários? Essa pergunta precisa ser feita, inclusive por aqueles que se opõem à paralisação. Até porque a greve vai passar e o vácuo vai permanecer.

E no meio desse fogo cruzado quem fica? Ora, o servidor municipal e quem depende do seu trabalho. Eu não sei se alguém tem uma luz aí, mas, como diria Milton Leite, que neste momento parece o narrador oficial da política itarareense: que fase.

Abraços, 
Murilo 

5 comentários:

  1. Legitima a greve sim, o que é lamentavel são os oportunistas se prevalecendo da situaçao para garantir possivel reeleiçao....mais lamentável ainda é saber q tem pessoas q se deixa levar pelo bla bla bla....

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  2. Uma pessoa ligada ao partido dos trabalhadores deveria saber mesmo, mas como não sou, é possível que eu tenha outras perspectivas de greve e mobilização sim que o impacto seja direcionado ao ente responsável e a abordagem com o entorno, a população é pelo convencimento e não pela perturbação... Abraços guri!

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  3. Negociação, diálogo, tolerância, calma, discernimento,ponderação...e principalmente humildade.A gente não vê isso por aqui (ADM 2012-2016)!

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  4. Juliano Pereira temos uma administração que nunca se comunicou com a população, fez-se de surda para o apelo popular, que não soube politizar o povo e transmitir uma mensagem serena, transparente e confiável. Esta administração tem sim um lado positivo para nossa cidade, mas o Ghizzilianismo imperou como uma única forma de governo e diálogo - criticou é contra!

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  5. Cristina e Dilma de diferença só prevalece o nome, dialogo com a população não existe. Com relação aos oportunistas isso em toda greve existe, como foi o caso da Gleisi na greve dos servidores do paraná.

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